Raizes Pentecostais

Por Altair Germano1
Pastor na AD Abreu e Lima (PE), professor da EETAD e autor das Edições Bernhard Johnson

Em seu sentido etimológico, a Teologia é basicamente o estudo sobre Deus. De uma perspectiva epistemológica, pode ser definida como o estudo sobre a revelação de Deus, dada por Ele mesmo aos homens. A palavra deriva do grego theos (Deus) e logos (estudo, palavra, discurso, afirmação, etc.). São muitos e diversos os aspectos da nova vida pessoal e ministerial cristã, em que a teologia pode ser considerada como útil e relevante. Nosso artigo considerará os seguintes: (a) o conhecimento sobre Deus; (b) a adoração e o louvor a Deus; (c) a interpretação e a exposição bíblica; e (d) a defesa da fé.

A Teologia Serve ao Conhecimento sobre Deus

O conhecimento sobre Deus é possível de se obter através de sua autorrevelação. Ele se revelou através de suas obras e palavras na história humana, em seus encontros com indivíduos em diversas épocas e lugares. Ele se revelou ainda através de Jesus Cristo e da Bíblia (Êx 32.9; 3.6; Sl 19.1; Jo 14.9; Rm 1.19,20; 2.15; 2Co 4.4; Cl 1.15, etc.). O conteúdo da Bíblia é aquilo que Ele queria que fosse comunicado. A revelação de Deus é uma expressão da Sua graça. Graciosamente, o Senhor revelou-se a si mesmo, bem como os seus caminhos e propósitos ao ser humano. 

O conhecimento sobre Deus nos proporciona edificação (crescimento, maturidade, progresso, etc.). Mesmo que não alcancemos o “todo saber” sobre Deus em todas as suas dimensões, devemos sempre procurar crescer nesse conhecimento (Jo 16.12,13; Ef 4.15; 2Pe 3.18). Em parte conhecemos (1Co 13.9a).

Tal conhecimento (gr. gnṓsis) tem implicações teóricas ou cognitivas e práticas ou experienciais/relacionais. É um conhecimento teologal e pessoal, que envolve saber e experimentar, ciência e experiência.

A Teologia Serve à Adoração e ao Louvor a Deus

A adoração é representada na Bíblia, principalmente por duas palavras. No Antigo Testamento é utilizado por mais de 170 vezes o termo hebraico shāhā, que significa “adorar, prostrar-se, curvar-se”. A palavra shāhā, apesar de não ser usada exclusivamente em relação a Deus, visto que o ato de se curvar é compreendido também como uma homenagem em respeito a um superior ou soberano humano (Gn 37.5,7,8; 1Sm 24.8; Rt 2.10 ss.), é o termo mais comum utilizado para se referir ao ato de estar diante de Deus em atitude de adoração (1Sm 15.25; Jr 7.2), sendo às vezes colocado junto com outro verbo hebraico que significa curvar-se fisicamente, seguido por adorar (Êx 34.8). No Novo Testamento ganha destaque o termo grego proskyneō (59 vezes), que significa “prostra-se, prestar homenagem a alguém” (Mt 2.2,8,11; 4.9; Mc 5.6; 15.19 Lc 4.7,8; Jo 4.20-22 ss.). Outras palavras no hebraico bíblico e no grego do Novo Testamento são utilizadas para definir a atividade de adoração, as quais destacamos: ‘ābad (2 Rs 10.19-23), sāgad (Is 44.15,17,19; 46.6; Dn 2.46), latreuō (At 24.14; Fp 3.3) e thrēskeia (Cl 2.18). 

No hebraico bíblico encontramos algumas palavras que são traduzidas como “louvar” e “louvor”, das quais destacamos duas. A primeira é o verbo hālal, que significa “louvar, celebrar, glorificar, cantar louvores, gloriar-se”. O termo é utilizado para louvar ou expressar admiração por pessoas (Gn 12.15; 2Sm 14.15; 2Cr 23.12 ss.), e para louvar a Deus (Sl 148.2-5,13; 150.1). A segunda palavra hebraica usada para “louvar” é o verbo yādāh, que significa “agradecer, louvar, glorificar”, e é encontrado cerca de 120 vezes na Bíblia hebraica (aproximadamente 70 vezes nos Salmos). Ela é usada em relação à adoração pública e pessoal (Sl 30.9,12; 106.47; 122.4 ss.). 

No Novo Testamento temos os verbos gregos: (1) aineō, que significa “falar em louvor de, louvar” (Lc 2.13,20; 19.37; 24.53; At 2.20,47; 3.8,9; Rm 15.11; Ap 19. 5 ss,); (2) hymneō, que denota “cantar, louvar, enaltecer, cantar hinos” (Mt 26.30; Mc 14.26; At 16.25; Hb 2.12); (3) psallō, que significa “cantar hinos, cantar louvores” (Tg 5.13); e (3) exomologeō, “eu te louvarei” (Rm 15.9). Os substantivos gregos traduzidos por “louvor” são: (1) ainos (Mt 21.16 Lc 18.43 ss.); (2) epainos, que denota “aprovação, elogio, louvor” (Rm 13.13; 1Co 4.5; 2Co 8.18; Ef 1.6,12,14; Fp 4.8; 1Pe 1.7; 2.14 ss.); e (3) ainesis, “louvor” (Hb 13.15). 

A teologia pode ser considerada como um ato de adoração a Deus. Através do estudo teológico nos aprofundamos no conhecimento sobre Deus, e esse maior conhecimento nos proporciona uma maior profundidade ou intimidade com Ele e na adoração a Ele. 

A nossa adoração e louvor ao Senhor, que faz parte do nosso culto e relacionamento com Ele, precisam estar fundamentados na obediência à Sua vontade, conforme revelada nas Escrituras Sagradas. A teologia correta (ortodoxia) contribuirá para a adoração e o louvor corretos (ortodoxologia). 

A Teologia Serve à Interpretação e à Exposição Bíblica

É através da Teologia Exegética que buscamos o sentido original intencionado pelo Autor ao interpretarmos o Texto Sagrado.  Esse sentido original pretendido pelo Autor é exatamente aquilo que diz respeito à intenção divina ao inspirar a Bíblia. 

Quando tratamos de interpretação bíblica, dois termos precisam ser inicialmente definidos: hermenêutica e exegese. A hermenêutica pode ser definida como o conjunto de regras e métodos para a interpretação de textos, enquanto a exegese é a hermenêutica na prática, que visa extrair do texto bíblico o seu significado e a intenção autoral.  

Aprendemos com a Teologia que com o abuso das interpretações bíblicas alegóricas da Igreja medieval, o método histórico-gramatical foi desenvolvido pelos Reformadores, que estavam interessados em chegar ao sentido óbvio, claro e simples das Escrituras. A observação das questões gramaticais e do contexto histórico do autor e de seus leitores originais deveriam ser consideradas. A necessidade da iluminação do Espírito não foi descartada, visto que as Escrituras eram inspiradas por Deus. Os Reformadores se preocuparam em determinar a intenção do autor, que seria o sentido pretendido por Deus. As interpretações do passado que concordavam com as Escrituras não foram desprezadas. Os métodos de análise textual desenvolvidos pelos Reformadores são usados ainda hoje, e evangélicos conservadores, como os pentecostais clássicos, continuam prestando atenção neles como fonte de inspiração. 

A fidelidade e integridade doutrinária na exposição bíblica está diretamente associada à boa interpretação. Além disso, o estudo teológico nos proporciona através da homilética a oportunidade de aprendermos e aplicarmos os princípios e fundamentos da pregação e do ensino da Palavra de Deus. A hermenêutica, a exegese e a homilética são disciplinas e conhecimentos, dentre outros, que fazem parte da “teologia prática”, ou seja, daqueles aspectos da teologia que devem ser também aplicados ao nosso fazer cristão e ministerial (serviço).

A Teologia Serve à Defesa da Fé 

Em sua função apologética a teologia possibilita o combate ao erro ou desvios (heresias), pois pressupõe o conhecimento da verdade doutrinária ou da ortodoxia (1Tm 1.3; 4.1,2; 6.3-5; 2Tm 4.1-4; Tt 1.9-11; 3.10,11). No Novo Testamento, a igreja teve que combater os ataques de fora e os desvios de dentro (Jd 3). Os falsos mestres tentavam disseminar na igreja o gnosticismo, uma mistura de fé cristã e filosofia secular, que considerava a matéria maligna e negavam a encarnação real e a ressurreição corporal do Filho de Deus (1Jo 2.22; 4.1-3), e o legalismo, uma mistura de fé cristã e judaísmo, que exigia dos cristão a observação de cerimônias e ritos judaicos para fins de salvação (At 15.1,2; 1Co 7.17-20; Gl 2.1-14; 5.6). 

Ao longo da História da Igreja, muitos desvios doutrinários surgiram. Atualmente, considerando o contexto pentecostal e assembleiano, há tentativas de disseminar no seio das Assembleias de Deus, no Brasil, a doutrina calvinista da predestinação, os progressismos evangélico (ideologização pós-marxista da fé), o ecumenismo (aproximação/união/fusão de todas as tradições cristã) e o pluralismo religioso (aproximação/união/fusão de todas as religiões). 

O conhecimento teológico-ortodoxo nos ajuda a identificarmos os ventos de doutrina que sopram de fora, e os desvios doutrinários que emergem de dentro da Igreja (At 20.29,30; Ef 4.11-14; Jd 3,4), e nos fornecem os meios e orientações adequadas para combatê-los (2Tm 3.1-5,10,14; 4.1-4; Tt 1.10-14; 2.1; 3.10,11).

Conclusão

Como observamos, a Teologia não diz respeito às especulações meramente teóricas e improdutivas, como alguns dela se instrumentalizam. Mesmo em sua dimensão mais teórica, a Teologia produz o devido conhecimento e edificação, que resultam em mudanças e transformações em nosso modo de pensar, ser e fazer. 

A Teologia é útil, sem ser utilitarista.

A Teologia é prática, sem ser pragmática.

A Teologia nos serve, e nos capacita para ser, saber e servir melhor para a glória de Deus!

Para ampliar seu conhecimento sobre o assunto, consulte as seguintes obras:

  • Meus conselhos aos jovens teólogos – Claudionor de Andrade. Edições Bernhard Johnson, 2023.
  • Você é teólogo e não sabe – Gunar Berg. Edições Bernhard Johnson, 2020.
  • História da Interpretação Bíblica – Gerald Bray. Vida Nova, 2017.
  • A Sã Doutrina: uma perspectiva pentecostal clássica – Altair Germano. Edições Bernhard Johnson, 2023.
  • Introdução à teologia cristã – Justo L. González e Zaida M. Pérez Hagnos, 2008.
  • Introdução à teologia evangélica: uma análise do tecido teológico – Richard Lintz. Vida Nova, 2022.
  • Uma introdução à teologia: das questões preliminares, da vocação e do labor teológico – James M. Sawyer. Editora Vida, 2009.
  1. Pastor, escritor e conferencista. Foi membro diretor da Sociedade Bíblica do Brasil (SBB), vice-presidente do Conselho de Educação e Cultura da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CEC-CGADB) e da Assembleia de Deus em Abreu e Lima (IEADALPE), e missionário na Itália. Atualmente é pastor auxiliar e presidente do Conselho de Doutrina da IEADALPE, e membro do Conselho de Doutrina da União de Ministros das Assembleias Deus no Nordeste (UMADENE). É mestre em teologia com especialização em ministério, especialista em educação cristã e em psicopedadogia, e licenciado em pedagogia. ↩︎