Raizes Pentecostais

Por Pastor Gunar Berg
Superintendente da EETAD e Edições Bernhard Johnson

É comum que os historiadores eclesiásticos reduzam o Pentecostes a um movimento restrito ao final do século XIX. Chamam-no assim mesmo, Movimento Pentecostal. Essa é uma forma limitada de compreender tudo o que Deus realizou desde Atos 2 através de Seu Santo Espírito. Estivesse correta, essa abordagem significaria que, depois do primeiro século, não mais houve batismos com o Espírito Santo, os dons espirituais não mais se manifestaram e as línguas estranhas não foram mais escutadas até que, sem motivo aparente, estas coisas ressurgissem. Foi assim? Após Pedro e os crentes no cenáculo (At 2), depois de Cornélio (At 10) e dos irmãos de Éfeso (At 19), os próximos falantes doutras línguas foram William Seymour e Charles Parham, mil e setecentos anos depois?

A história conta de alguns personagens, incontestavelmente, cheios do Espírito Santo de Deus, falantes de outras línguas, batizados no fogo do batismo de Cristo. Os seus nomes podem surpreender, afinal, a teologia reformada esconde que eles fossem batizados no Espírito Santo. Eu digo, entretanto, que é mais fácil provar-lhes o revestimento de poder que desacreditar-lhes o batismo. Eles viveram revestidos de poder depois dos apóstolos e antes de Parham e Seymour.

Uma era do Espírito?

Por alguma razão antibíblica, muitos crentes entendem que cada uma das três Pessoas da Santíssima Trindade comanda tempos históricos específicos: no Antigo Testamento o Pai estaria no controle; após a assunção de Cristo ao céu, o Espírito Santo assumiu o controle e permanecerá assim até que, finalmente, o Senhor Jesus instaure o reino Milenial. Sugestivo, mas herético.

Embora a ênfase sobre a pessoa do Deus Pai seja inegável nos tempos do Antigo Testamento, de forma alguma o Espírito Santo e o Cristo de Deus estiveram ausentes ou sem protagonismo na Antiga Aliança. Ao contrário, os três atuam desde o princípio de todas as coisas. Mesmo no primeiro instante do tempo, quando Deus disse “Haja luz”, o Filho operou a criação e o Espírito dominava a face das águas. Logo, desde Atos 2, não houve momento histórico menos poderoso do que os tempos de, Seymour, Gunnar Vingren, Bernhard Johnson ou os nossos próprios.

O arranjo didático para contar a história do Cristianismo sugere que, desde o encerramento da igreja apostólica, com o falecimento de João, o Carisma se foi, desapareceu. Mesmo os heróis da fé, como Jerônimo, Savonarola, Lutero, Calvino, Huss e tantos outros, pareciam não estar sob a promessa do Espírito. Até que, de repente, no século XIX, as pessoas voltaram a ser batizadas com o Espírito Santo. Seria isso mesmo? O fato de a história do Cristianismo ser contada, majoritariamente, por historiadores de igrejas não pentecostais é algo que não pode ser ignorado.

A igreja de nosso Senhor sempre foi pentecostal. É impossível que o povo de Deus tenha passado mil e setecentos anos sem falar noutras línguas. Se é verdade que Pahram e Seymour merecem destaque, os pentecostais anteriores a eles requerem atenção, pois a Igreja do Cordeiro é Pentecostal. Sempre foi e sempre será:

  • Justino Mártir (100–165) escreveu que os crentes de seus dias expulsavam demônios e curavam enfermos;
  • Irineu (140–203) dizia ser impossível calcular as manifestações de dons nos seus dias;
  • Os irmãos montanistas entraram para a história como hereges, mas os estudos sinceros sobre eles ensinam que, já nos anos 160 da Era Cristã; eles estavam deveras incomodados com a frieza espiritual que já se assenhorava da igreja primitiva. Tertuliano escreveu que eles eram doutrinariamente assemelhados a toda a cristandade.
  • Ambrósio (399–397) testificou curas e línguas estranhas;
  • Agostinho (354–97) falou sobre cegos, doentes e endemoninhados, solvidos de seus problemas. Também disse sobre mortos voltando à vida;
  • Francisco de Assis (1181–1226) teve um ministério repleto de milagres;
  • Lutero (1483–1546) curou enfermos em nome de Jesus;
  • Wesley (1703–1791) disse que a falta de fé e de santidade afasta o Espírito Santo, e teve o coração aquecido quando foi batizado.

Vê-se, então, que a ação do Espírito Santo de Deus, desde Atos 2, manteve-se intensa como no evento contado pelo médico amado, Lucas. Não é exato falar em um século do Espírito, em uma era do Espírito, pois não houve momento em que o Espírito Santo tenha deixado de agir. Os frios pesquisadores puderam usar a distância histórica para esconder que os heróis da fé são carismáticos, mas ocultar o Espírito Santo dos seus contemporâneos não foi possível aos gélidos teólogos acadêmicos.

A verdadeira igreja é Pentecostal

Uma das mais absurdas mentiras já contadas nos púlpitos de muitas igrejas é a de que os dons espirituais e o batismo com o Espírito Santo sejam restritos aos tempos do Novo Testamento. Alguns anos atrás, convidado por uma grande editora pentecostal para trabalhar na revisão de uma teologia sistemática escrita por um autor estrangeiro, deparei-me com dois capítulos inteiros daquela obra dedicados a negar que hoje alguém possa ser revestido com poder e falar em línguas estranhas. O que senti lendo aqueles muitos parágrafos foi medo, um temor grandíssimo e um tremor incontrolável. Como poderia ser que alguém que haja dedicado tantos anos de sua vida à Bíblia tenha alcançado a conclusão equivocada de negar o poder pentecostal? Ressentia-me, durante a leitura, de estar encarando o texto de um homem que talvez tenha comprometido irremediavelmente a sua salvação ao negar a obra completa do Espírito Santo, e com tanto empenho. Foi uma experiência triste. 

Conforme avançava em meu trabalho (que logo se tornou em apologia ao Espírito, pois reescrevi ambos os capítulos), um som não me deixava os ouvidos. Parecia que eu escutava repetidas vezes os acordes executados pelo saudoso Pastor Horácio da Silva Júnior em um órgão que ficava junto ao púlpito do templo sede da Assembleia de Deus em Bento Ribeiro, na cidade do Rio, onde passei bons anos de minha infância. Todo dia de batismo, o Pastor Horacinho sentava-se ao órgão e repetia estrofes e coros de hinos da Harpa conforme os irmãos eram descidos às águas. De todos os versos, o que mais me encantava o coração, o meu predileto, era o coro do hino 437: 

Assim que Deus me batizou 
A minha alma viu mais luz 
Pois dom celeste o Pai mandou 
Pra dar louvor ao meu Rei Jesus 
Sou testemunha do meu Senhor 
E sempre dele vou falar 
Também do selo de amo 
Que o meu cálice faz transbordar 
Louvado seja Jesus, o Cristo, 
que continua a batizar 
com língua estranha, nós temos visto 
o dom celeste o Pai mandar 

Assim, eu venci aquela leitura sem contaminar minha alma. 

A história prova que a verdadeira Igreja é pentecostal. O Pentecoste faz parte da identidade da Igreja perfeita de nosso Senhor Jesus! 

A era do Espírito Santo corresponde à era da própria Igreja de Cristo. Ao interpretar corretamente o profeta Joel, Pedro assinalou o início da era dos gentios. Escatologicamente, aliás, o período da Igreja corresponde ao interregno entre a sexagésima nona e a septuagésima semana do profeta Daniel. Significa que os tempos escatológicos foram iniciados ali também — e certamente vivemos, hoje, os tempos apocalípticos, pois já estamos nos primeiros três capítulos da Revelação que registrou João em Patmos. Assim, nunca houve um momento histórico, especialmente desde Atos 2, em que o Espírito não tenha revestido de poder aos santos, e esta promessa caminha para o seu ápice, posto que o seu cumprimento já se iniciou. A Igreja de nosso Senhor é pentecostal, e jamais houve um só dia em que não haja sido.