Raizes Pentecostais

Por Pr. Claudionor de Andrade
Conselheiro Bíblico da EETAD e Edições Bernhard Johnson

Não me lembro quando orei pela primeira vez. Confesso-lhe, porém, querido leitor, que sempre dependi de uma oração, em casa, de uma intercessão, na igreja, e de um rogo, em pleno deserto, a fim de alcançar a Jerusalém Celeste. Aliás, como pode viver o homem sem falar com Deus? Sem o Criador, a criatura nada é; com Ele, tudo é possível.

Na infância, dependia das orações de minha mãe; os exames finais de matemática assustavam-me. Já adolescente, buscava as intercessões de meu pastor; as angústias espirituais pareciam afogar-me. Na juventude, perplexo quanto aos desafios que me espreitavam, além de orar, nunca deixei de implorar pelas lágrimas de meus queridos irmãos; muitos choraram em meu favor.

Agora, sou velho. E, quando me ponho a repassar a minha jornada, maravilho-me. No meu espírito, indago-me temeroso: Como logrei chegar até aqui? As lutas, muitas. Sem conta, as aflições e as dores. Os que me queriam prostrado (e até morto) não foram poucos; não os odeio, porquanto fizeram parte de meu aprimoramento espiritual; por eles, amorosamente oro. Enfim, sem oração, jamais estaria eu aqui, hoje, a escrever estas palavras, frases e orações ao Pai Celeste.

Definindo a oração

A estas alturas, agora a desfrutar intensamente de Cristo nos lugares celestiais, acredito já poder definir a oração. Como não tenho palavras mais sublimes, usarei as que me acompanham desde a meninice; outras hão de aparecer ao longo do percurso. 

Sempre inspirada e bela, a Escritura ensinou-me ser a oração, que nos requer o Pai Celeste, mais do que uma reza; vai além daquele grito que, numa instância gravíssima, endereça-se aos falsos intercessores (e são milhões!), que povoam os medos e pavores daqueles que, ainda, não tiveram um encontro pessoal com Jesus Cristo, o Eterno Filho de Deus. Após o encontrarmos, faz-se Ele nosso bastante medianeiro, conforme escreveu o irmão Paulo:

Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem, o qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para servir de testemunho a seu tempo” (1Tm 2.5,6).

Sim, atencioso leitor, a oração não é uma mera prece – formal, protocolar e, depois, inumada num arquivo morto –, mas o portal da comunhão viva e vivificante, que o Pai nos franqueia, mediante o sacrifício de seu Cordeiro, no Calvário. A partir da oração é-nos possível chegar ao Terceiro Céu, como ocorreu com o santo apóstolo. Foi-lhe tão forte e intenso o reencontro com o Senhor, que, ao descrevê-lo, não sabia se estava no corpo ou fora do corpo (2Co 12.1-10).     

Ouso, agora, já ornado pelas cãs, ensaiar um significado mais profundo da oração. Não foram poucas as ocasiões que, em meus devocionais diários, roguei ao Senhor que me iluminasse a mente acerca de alguma questão doutrinária. Os livros não eram suficientes. As pesquisas, inúteis. As cogitações, árduas e infrutíferas. Mas a oração ajuda-nos a compreender o que já foi revelado aos santos profetas e aos apóstolos de Nosso Senhor. No terreno da oração, a resposta certeira. Até aquele momento, todavia, eu não conseguira vê-la. Foi-me necessário orar, para que o Senhor ma fizesse clara aos seus pés.

Por conseguinte, a oração é o labor teológico mais excelente que podemos oferecer a Deus. Já humilhados aos seus pés, reconhecemos-lhe o absoluto senhorio de quanto existe, pois tudo quanto há (e ainda haverá) foi por Ele Criado. Sim, tudo quanto podemos ver e tudo o que, ainda, não conseguimos ver, nem devemos enxergar, foi por Ele feito possível. Ele, o Criador; eu, a criatura. Na oração, porém, abre-me Deus o canal de comunhão que, no Calvário, seu Filho me tornou possível, viável e concreto.

Impotente aos seus pés, faço teologia. Ele me torna a sua palavra escrita – a Bíblia Sagrada – mais clara, mais viva e mais vivificativa. Mostra-me, à luz das profecias, o que está prestes a ocorrer. Ouço a voz de Moisés, de Samuel, de Isaías e de Daniel. A voz de Paulo, de João e de Pedro é-me salvadoramente nítida. Ali, humilhado e impotente, aviva-me o Espírito Santo; a bendita esperança tonifica-me a alma; em breve estrugirá a última trombeta, anunciando o arrebatamento da Igreja de Cristo.

Se faço teologia à fonte de toda a Teologia, preciso conduzir-me com temor e tremor; estou aos pés do Todo-Poderoso. Por este motivo, aconselho-me com Salomão que, sabiamente, adverte-me: 

Guarda o teu pé, quando entrares na Casa de Deus; e inclina-te mais a ouvir do que a oferecer sacrifícios de tolos, pois não sabem que fazem mal. Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu estás sobre a terra; pelo que sejam poucas as tuas palavras. Porque da muita ocupação vêm os sonhos, e a voz do tolo, da multidão das palavras. Quando a Deus fizeres algum voto, não tardes em cumpri-lo; porque não se agrada de tolos; o que votares, paga-o” (Ec 5.1-4).

Deus, no Céu; eu, na Terra. Mas a distância entre o Pai Celeste e o filho que, peregrino, anseia por ser recolhido ao regaço paterno, desaparece; ali, já não existe dor, choro ou lágrimas. Sim, orante leitor, se atentarmos às medidas humanas, o intervalo entre a Terra e o Céu é astronômico; nenhuma nave o transporá. Então, como teologar se a longura entre o Criador e a criatura é tamanha? Ansioso, ouço o Verbo Divino:

Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida. Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6).

O Filho elimina-me a longuidão com o Pai. Somente nele, a comunhão com Deus é possível, clara, imediata, plena e mui desejável; não há burocracias filosóficas, teológicas ou psicológicas. Além dessa convicção, cientifico-me de que já posso aproximar-se do Altíssimo para laborar teologicamente com estes três pressupostos áureos: existe um caminho absoluto, uma verdade também absoluta e, igualmente, uma vida absoluta – eterna, não mais submissa à morte.

Junto a Deus, nada é relativo; tudo é absoluto

Sim, teológico leitor, junto a Deus nada é relativo; tudo é absoluto. Mas vem a academia pós-moderna confrontar-me. À semelhança de Pilatos, indaga-me o que é a verdade. Biblicamente, explico-lhe o que é a verdade absoluta. Mas, além da academia pós-moderna, tenho de enfrentar o corretor gramatical do meu computador, que, já contaminado por essas modernices, ensina-me que “verdade absoluta” é redundância. Portanto, se eu deixar apenas o substantivo sem o adjetivo, a frase soará como o Diabo gosta: politicamente correta. Ato contínuo, sempre professoral, a modernagem toda vem sobre mim e declara, absolutamente, que só a verdade relativa existe; o corretor gramatical faz-se tirano.

Já que estamos no Céu, junto ao trono do Todo-Poderoso, é-nos facultado o uso de termos absolutos, porquanto os termos relativos não têm guarida nos livros do Altíssimo. Por isto, recorro a outras certezas a fim de permanecer na presença do Pai. Aprendo com Daniel, que existe, de fato, um Deus no Céu (Dn 2.28). Já com o apóstolo, aprofundo-me nesta certeza e santa convicção:

Ora, sem fé é impossível agradar-lhe, porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que é galardoador dos que o buscam” (Hb 11.6).

Agora, com o coração quebrantado, sinto-me plenamente acolhido pelo Deus de amor, conforme realça-me Davi:

Os sacrifícios para Deus são o espírito quebrantado; a um coração quebrantado e contrito não desprezarás, ó Deus” (Sl 51.17).

Volto aos atributos absolutos de Jesus Cristo, nosso adorável e divino Senhor, e guardo-os no espírito: caminho absoluto, verdade absoluta e absoluta vida. Logo, descubro que, na oração, posso não somente teologar, como também cientificizar (não achei verbo mais adequado; tive de optar por este neologismo; acredito que servirá). Sim, orando faço teologia e não deixarei de fazer ciência, pois, em meu Salvador, residem todos os tesouros do conhecimento (Cl 2.3). Conquanto não sejamos acadêmicos, o Espírito Santo deu-nos suficiente discernimento, para sabermos o que é fantasia, o que é hipótese, o que jamais será teoria e o que é mero cientificismo.

A teologia aos pés de Cristo

Hoje, ao passarmos em frente a um seminário, observou-me o amigo Bruno: “Eis uma instituição de ensino liberal”. Após discorrermos acerca dessa praga, que se espalha por todo o Brasil, meu amigo comentou dogmaticamente: “A genuína teologia bíblica é impossível sem a oração”. Meu assentimento foi imediato; não podemos dissociar o teologar do orar; são verbos inseparáveis, gêmeos e mais que siameses; rimam na Vinha do Senhor.

O crente humilde lança-se aos pés do Senhor da Vinha e põe-se a orar. E, sem o perceber, ora os credos mais elaborados, sublimes e belos. Hoje, o Credo dos Apóstolos; amanhã, o Credo Niceno; no terceiro dia, ei-lo a rogar ao Senhor, nas palavras do Credo Atanasiano. Quanto mais ora, mais a sua oração faz-se bíblica, teológica e sistemática, porquanto o Espírito Santo ajuda-nos a orar (Rm 8.26).

Naquele momento, suas petições, sempre humildes e, às vezes, humilhadas, são enaltecidas pelo Pai Celeste, porquanto aprendera ele a orar com os santos profetas e apóstolos. Por esta razão, ora biblicamente. E, teologicamente, derrama a sua alma perante aquele que jamais nos ignorará os clamores e as intercessões. Ali, no secreto de seu quarto, apropria-se de mui preciosíssimos tesouros. Com o profeta Daniel, vai além da mera hermenêutica (Dn 9.1,2). Já com o apóstolo Paulo, vai além da simples homilética, porque roga as orações dos santos, para que a Palavra de Deus tenha livre curso (2Ts 3.1). E, finalmente, com o Senhor Jesus, com quem suspira a orar, exercita-se no Jardim da Agonia; lágrimas e sangue já se misturam em glória (Jo 17).

Além de orar teologicamente, o discípulo de Jesus também sabe orar cientificamente. E, neste labor, não se prende à simplória ciência. Afinal, acreditar em certas teorias (que nem teorias são) é simplismo. Quem ora e lê a Bíblia Sagrada faz-se mais sábio do que os mestres deste mundo; não lhe falta a mente de Cristo (1Co 2.16).  

O cientista incrédulo não sabe como surgiu o Universo. Mas o crente humilde, mesmo ignorando os cânones da ciência, louva a Deus por haver criado os Céus e a Terra. O primeiro aferra-se a tolices como o big bang, mas o segundo, pela fé, “entende que os mundos, pela palavra de Deus, foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente” (Hb 11.3). 

Em sua humildade, o crente também louva a Deus, por haver o amoroso e santo Deus formado, do pó da terra, o homem; o evolucionismo é-lhe uma ofensa contra o Criador (Gn 2.7). Somos imagem e semelhança do Deus que, de tal maneira nos amando, entregou o Unigênito para morrer em nosso lugar; nele, viveremos eternamente. 

Mesmo humilhado, o crente entende melhor a criação do que o cientista, porquanto a sua caridade condu-lo ao temor do Senhor – o princípio da ciência (Pv 1.7). Assim, há de resplandecer como os astros no firmamento, conforme prometeu-nos o Altíssimo (Dn 12.3). A oração, por conseguinte, vale mais que a universidade, porque nos faz compreender o que os sábios e entendidos deste mundo feiamente ignoram (Mt 11.25,26). 

Conclusão

Como ter uma oração teológica? Antes de tudo, tenha a Bíblia Sagrada como a inspirada, inerrante, infalível, completa, suficiente, soberana, perfeita, inteligível, sempre atual e eterna Palavra de Deus. Se você assim a considera, leia-a todos os dias e, o dia todo, medite em seus preceitos. Não se limite a lê-la e, nela, meditar. Pratique-a. Torne-a bem visível em seu cotidiano.

Finalmente, não deixe de orar. Aprenda a orar com os santos profetas e com os apóstolos de Nosso Senhor. Jesus foi um exemplo de oração. Todos os seus clamores estavam em plena harmonia com as Sagradas Escrituras. Que divino exemplo para nós peregrinos e orantes! Oremos bíblica e teologicamente.