Pr. Gunar Berg 1
Superintendente da EETAD e Edições Bernhard Johnson

O mau jornalismo se utiliza de um recurso ardiloso na propagação dos juízos que deseja promover, a “câmara de eco”. Trata-se da repetição de determinadas fórmulas, sentenças específicas ou expressões recorrentes que, repetidas por todos os integrantes de um consórcio, são rapidamente assimiladas pela maior parte da população. Sem filtros e senso crítico, a audiência destes veículos agrega aos seus valores tudo quanto ressoa na câmara de eco; afinal, se tantas empresas jornalísticas, concorrentes entre si, dão repercussão à mesma notícia sem desmentidos, deve ser verdade.
A teologia sofre com as especulações em recâmaras desde sempre. Ainda no primeiro século, a Igreja Apostólica necessitou lutar contra o gnosticismo em todas as frentes geográficas da expansão do Caminho. As igrejas da Ásia Menor eram alvos preferenciais dos pregadores da gnose, mas os crentes da Acaia e da Macedônia não estavam livres de suas abordagens. O século quinto foi outro momento de ressonâncias heréticas. Certo bispo africano chamado Aurélio Agostinho, servindo-se do neoplatonismo, começou a pregar algo que os pais da igreja anteriores a si jamais ensinaram. Aliás, os patrísticos e os apóstolos nunca afirmaram a predestinação, pois esta não é uma doutrina bíblica. Mesmo assim, esta heresia ainda faz eco nos recônditos teológicos.
A lista de controvérsias doutrinárias é quase interminável. Constam nela o argumento anti-trinitariano, os erros quanto as duas naturezas de Cristo, a mariolatria, a iconoclastia, a simonia, a transubstanciação e a consubstanciação, e segue a criatividade errática. Estes enganos arrastaram a milhões, pois a sua repetição sistemática por dezenas de teólogos proeminentes e de diferentes denominações e regiões os fizeram ganhar áurea de verdade, chancela de doutrina.
Se nos séculos passados as câmaras de eco da teologia resumiam-se às celas dos mosteiros, às bibliotecas pouco frequentadas, ou aos púlpitos sem concorrência, desde a reviravolta cultural ocasionada pela prensa tipográfica de Johannes Gutenberg, as câmaras de eco tornaram-se mais abstratas e amplas, mas sem grandes mudanças, até o advento das redes sociais. Não há dúvidas de que o acesso às redes é universal, e cada perfil pode tornar-se um púlpito acompanhado por milhões, uma cátedra de alcance inestimável. Contudo, a tendência à reprodução dos erros é absurdamente superior à proclamação da verdade, pois é assim que a humanidade escolheu viver.
Longe de significar, porém, que as redes sociais devam ser monitoradas ou censuradas, a multiplicação das heresias nos perfis dos falsos profetas e seus seguidores deve fazer com que nos identifiquemos como os sinceros da fé: “E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós” (1Co 11.19).
Na última década, algumas heresias reavivaram-se na internet. Como vagas incontroláveis em alto mar, a mentira, mais instagramável que a verdade, lançou-se contra o rochedo das Escrituras. A sua arrebentação foi barulhenta, mas em nada ameaçou a Palavra. Mesmo assim, as hordas de tolos arrastados pela maré foram numerosas. Na última década, revivemos o Sínodo de Dort em sua versão on-line, e os intermináveis debates entre calvinistas e arminianos vitimaram jovens pentecostais sem convicção bíblica, arrastando-os ao que imaginavam ser erudição bíblica, mas que não passava de perfumaria herética.
Em seguida, os cessacionistas negaram frontalmente a atualidade dos dons espirituais, e novamente os tolos (inclusive não poucos de igrejas pentecostais) sequer demonstraram incômodo; muito pelo contrário, diversos passaram a defender a ordenação de obreiros não batizados com o Espírito Santo! Agora é a vez do arrebatamento.
A doutrina do arrebatamento pré-tribulacionista não é uma questão de tradição ou pertencimento denominacional, mas uma convicção firmemente enraizada nas Sagradas Escrituras. Passagens bíblicas como 1 Tessalonicenses 4.16-17 e Apocalipse 3.10 evidenciam que Deus designou um momento específico e imprevisto para a Igreja ser retirada da terra, e isto será antes que o caos da Grande Tribulação se desenrole. Essa interpretação ressoa a natureza amorosa e redentora de Deus, que não deseja que os salvos enfrentem a ira vindoura. Assim, o pré-tribulacionismo emerge como verdade bíblica forte e inegável, expondo a bondade de Deus.
O ensino do pré-tribulacionismo é uma prerrogativa fundamental para a saúde teológica da Igreja. Enquanto a confusão da multiplicação de heresias faz ecoar os enganos capazes de enganar aos incautos, a certeza do arrebatamento pré-tribulacionista é sinal de que a Igreja se mantém firme sobre a Rocha. O arrebatamento pré-tribulacionista é a doutrina do consolo, da esperança e segurança.
Vejamos a lástima em que se encontra a teologia geral no Brasil: nas redes sociais, as três vozes mais escutadas quanto à doutrina das últimas coisas são a de um calvinista, um sabatista e um ex-pentecostal! E o que eles ensinam? Dentre outros enganos, que o arrebatamento pré-tribulacionista da igreja é uma doutrina inexistente nas Escrituras, sem fundamento bíblico e sem lastro histórico. Qual é o resultado disto nas mentes dos que navegam as redes sociais? Desconfiar da clareza doutrinária da escatologia bíblica ensinada em nossas igrejas, explicitada nos Manuais da EETAD, esposadas pelos pentecostais.
Mas o pior dos efeitos, parece-me, está exatamente entre os que ainda defendem o arrebatamento pré-tribulacionista, como resultado de uma tradição, de uma linha teológica ou de uma denominação. Esta é, sem dúvida, a pior forma de sustentação doutrinária que há. Afinal, eu não creio no arrebatamento iminente e anterior à Grande Tribulação porque sou pentecostal ou assembleiano. Eu sou pentecostal e creio no pré-tribulacionaismo porque estas confissões são bíblicas, e no dia em que minha igreja se desviar deste ensino, eu me manterei fiel às Escrituras, e não às tradições.
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- Gunar Berg de Andrade é historiador e formado em Teologia pelo Instituto Bíblico Pentecostal e pela Global University. De suas atividades destaca-se que é coordenador acadêmico da Escola e Faculdade de Educação Teológica das Assembleias de Deus – EETAD e FAETAD, professor-fundador do Instituto Bíblico de Paulínia (SP) e professor-convidado de outros seminários. Seus artigos e reflexões são publicados nos periódicos da Casa Publicadora das Assembleias de Deus – CPAD; além disso, mantém um canal no YouTube (youtube.com/c/gunarberg). Ele é co-autor e autor de outros 5 títulos. Nascido em Diadema-SP, o pastor Gunar Berg e sua esposa Ana Lúcia e suas duas heranças, Estevão (15) e Amy Beatrice (8), moram no interior do estado de São Paulo, e servem ao Senhor nas Assembleias de Deus. ↩︎